quinta-feira, 26 de junho de 2014

Diálogo entre os pensamentos de Momigliano, Dosse e Ginzburg.

Marcos dos Anjos Bezerra
Ana Cristina Bernardes Souza

Para Momigliano Heródoto é de fato o pai da História, devido ser de sua autoria a criação de um novo método: o da investigação, bem como a separação entre o que é fantasia e o que de fato interessa e deve ser registrado, isto se dá por meio da seleção de fontes, principalmente por uma crítica a oralidade.

Momigliano traça um confronto entre os pensamentos históricos de Tucídides e Heródoto, onde o primeiro critica ao máximo a produção histórica do segundo. Se Heródoto enfatiza a oralidade, ou seja, o que vê e ouve; valoriza o passado e não se responsabiliza pelo que escreve, deixando a critério do leitor tirar suas conclusões; Tucídides ao contrário dá mais importância não ao que ouve, mas ao que de fato pode ser provado mediante uma análise crítica dos documentos escritos e se responsabiliza pelo que escreve, ou seja, tem a preocupação com a verdade; considera o passado menos importante que o presente e enfoca como essencial a história política. Apesar das divergências sobre a abordagem histórica, Tucídides e Heródoto, segundo Momigliano, se complementam em suas formas de análises. 

Para complementar a abordagem de Momigliano, tem-se o pensamento de François Dosse. Ele traz os pontos debatidos por Momigliano, tais como considerar Heródoto e Tucídides como inovadores da abordagem histórica, traçando as semelhanças e divergências entre as suas formas de vê e analisar os fatos históricos. Inova ao trazer o pensamento histórico até meados do século XIX, enfatizando a importância da descoberta de Lorenzo Valla a respeito da falsificação da doação de Constantino de terras e poderes a igreja católica; apresenta a relevância que alguns mosteiros tiveram na produção da historiografia; aborda a escola metódica do século XIX, tendo em vista a separação da História da literatura por meio um método rigoroso, onde a verdade e a objetividade são os alicerces da história e esta verdade dá-se por meio da crítica externa e interna dos documentos, cabendo ao historiador controlar sua subjetividade e encontrar as verdades nos documentos.

Outro pensador que aborda a descoberta de Valla como uma nova fase da historiografia por provar que não existe a imutabilidade de verdades foi Carlo Ginzburg em sua segunda parte do livro Relações de Força: história, retórica, prova. Assim como Dosse, Ginzburg aponta as causas que levaram Valla a tal formulação, sendo uma de natureza lógica ou psicológica e outra baseada em anacronismos linguísticos presentes na carta de doação.

Diferentemente de Momigliano e Dosse, Ginzburg não traz a disputada entre os pensamentos de Heródoto e Tucídides, em pelo menos nos dois tópicos de seu livro.

E diferente dos demais, Ginzburg, pelo menos nos textos lidos, aborda a questão da retórica enquanto pensamento de Aristóteles. Este afirmava que a poesia tinha uma posição mais elevada do que a história, onde a poesia representava eventos gerais e possíveis e a história estaria atrelada a eventos particulares e reais. No entanto, Ginzburg não aceita esta definição para com a história, pois para ele reduzir a historiografia à retórica poderia levar ao ceticismo, além de que a história do qual falava Aristóteles não tem o mesmo sentido de que se fala hoje. Conceituar a história como retórica é afirmar que o papel principal do historiador é convencer algo a alguém e não a verdade, mas esta abordagem a respeito da história é criticada por Ginzburg e Momigliano.

Segundo Carlo Ginzburg, Lorenzo Valla não se contentou com o pensamento de Aristóteles a respeito da história. Valla chegou a afirmar que a história era mais antiga e, portanto mais venerável do que a filosofia e a retórica e que a história tem mais relação com o universal.

Conclui Ginzburg ao dizer que a redução da história à retórica pode e deve ser rechaçada pela reavaliação da riqueza intelectual da tradição que remonta a Aristóteles e à sua tese central: as provas, longe de ser incompatíveis com a retórica constituem o seu núcleo fundamental.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

DOSSE, François. O historiador: um mestre de verdade. In: DOSSE, François. A história. – Bauru, SP: EDUSC, 2003. p.13-46.

GINZBURG, Carlo. Lorenzo Valla e a doação de Constantino. In: GINZBURG, Carlo. Relações de força: história, retórica, prova. – São Paulo: Companhia das letras, 2002. p. 64-79.

GINZBURG, Carlo. Sobre Aristóteles e a história, mais uma vez. In: GINZBURG, Carlo. Relações de força: história, retórica, prova. – São Paulo: Companhia das letras, 2002. p. 47-63.

MOMIGLIANO, Arnaldo. A tradição herodoteana e tucidideana. In: MOMIGLIANO, Arnaldo. As raízes clássicas da historiografia moderna. – Bauru. SP: EDUSC, 2004. p. 53-83.

Nenhum comentário:

Postar um comentário