quinta-feira, 26 de junho de 2014

Opressão, aculturação e guerra na América Espanhola

Marcos dos Anjos Bezerra

       O período que se inicia com as conquistas até aproximadamente a década de 1540 na América é conhecido como a época dos conquistadores. Neste período, os espanhóis utilizavam duas formas de trabalho para extrair riquezas: a escravidão e a encomienda.
       A escravidão tinha por base as interpretações dos textos de Aristóteles. Tinha-se também a visão que os povos americanos eram inferiores e, portanto, poderiam ser reduzidos à escravidão por uma sociedade que lhe fosse superior, no caso a espanhol.
        Foi somente em 1530 que o trabalho escravo foi proibido nas terras conquistadas, mas os escravos não forma libertos de imediato, mas alguns se suicidavam e outros adquiriam a alforria.
      Outra modalidade de trabalho paralela à escravidão foi a encomienda: Aos conquistadores, aos serviços prestados à coroa, era encomendada uma comunidade, ao qual deveria defender e ensinar a religião católica e em troca, a comunidade deveria pagar-lhe tributos em espécie ou em trabalho.
          Para sistematizar a organização do trabalho na América Espanhola foi promulgada em 1542 as “Leis Novas”. E em 1548 uma nova legislação estabeleceu o repartimiento dos índios, as comunidades deveriam ceder certo número de homens para trabalharem nas minas, fazendas e cidades. Geralmente estes trabalham durantes alguns meses a um ano, e o trabalhador recebia um salário para que pudesse sobreviver e pagar tributo ao rei. No entanto, era um salário pequeno e recebia diversos descontos. O repartimiento nas sociedades astecas foi uma reformulação da mita, claro com as concepções dos espanhóis.
      A introdução da economia mercantil contribuiu para a desestruturação das relações econômicas e culturais das populações submetidas ao domínio colonial. E suas consequências foram a aumento da mortalidade e a queda da taxa de natalidade.
        Mas o grande terror das populações nativas era o repartimiento nas minas, o que levava muitas mães a torcerem os pés de seus filhos para que futuramente fossem dispensados desta atividade. As minas mais conhecidas eram as de Potosí (prata) e a de Huancavelica (mercúrio).
        O repartimiento de índios requisitava também homens para o trabalho nas manufaturas. E assim como os mineiros recebiam baixos salários e eram submetidos à condição de trabalho de grande dureza.
        A imposição de tributos como a encomienda e o repartimiento desestruturam as relações tradicionais de trabalho dos americanos que, com excessivos trabalhos, não encontravam meios para reproduzir seus bens materiais e simbólicos.
     Os excessivos trabalhos desarticularam as relações do homem com a natureza e com eles mesmos, provocando uma crise de identidade própria. Muitos se suicidaram, praticavam infanticídio, abortos, abstinência sexual e alimentar.
        Além de instituírem uma nova forma de trabalho os espanhóis impuseram uma nova forma de religião: o cristianismo. Houve uma condenação das divindades locais.
       Ser vencido pelos espanhóis não representou apenas uma derrota militar, mas uma derrota religiosa. Ser vencido significou que seus entes sobrenaturais haviam perdido o poder. E os católicos negavam a forma de viver e a maneira como os americanos organizavam sua realidade social e cultural. Com isso o aparato cultural e simbólico das populações se desestruturaram.
      Pode-se dizer que o contato entre culturas tão diversas (americana e europeia) desencadeou o fenômeno da aculturação. E tal fenômeno apresenta varias formas e variantes. E segundo Wachtel são dois os tipos de tipologia da aculturação: o primeiro se refere a integração, ou seja, uma aculturação espontânea, o dominado incorpora valores e simbologias da cultura dominante por vontade própria para satisfazer interesses imediatos; o segundo refere-se a assimilação, ou seja, uma aculturação imposta mediante imposição. A cultura dos dominados foi negada, combatida e proibida; a cultura dominante foi imposta pela força.
          Somou-se a uma nova forma de trabalho e ao processo da aculturação a extirpação da idolatria, ou seja, houve uma repressão e proibição dos cultos dos americanos. Nos primeiros tempos da conquista a repressão religiosa limitou-se a destruições, incêndios e saques aos templos, túmulos, estátuas e objetos sagrados.
          Ao mesmo tempo em que a religião tradicional era proibida, a colonização espanhola empenhou-se no processo de evangelização, mas esta se deu de forma superficial devido, sobretudo a insuficiência numérica de funcionários e ao próprio despreparo dos religiosos.
        Como campanha da extirpação das idolatrias dos povos americanos, implantou-se a visita das idolatrias, muito temida na época. Esta visita se resumia em visitas a varias regiões durante quinze dias e promovia interrogatórios, confissões, procissões e incentivava delações, havia destruição de santuários e estátuas sagradas, além de se queimar múmias dos antepassados. Todos esses fatores eram vistos pela população local como amedrontador, assustador.
          No entanto, as populações nativas não se conformavam com tal situação e chegaram a promover resistências a dominação espanhola. O exemplo clássico de resistência ao domínio espanhol foi à revolta elaborada por Manco. Este não conformado pelas humilhações que recebia da “elite espanhola” reuniu um exercito de cinquenta mil homens e chegou a provocar pânico aos espanhóis, mas seu exercito enfraqueceu em razão de seus soldados voltarem a cultivarem suas terras, e Manco teve que recuar. Não foi somente este conflito que aconteceu, teve outros que se levantaram contra a imposição cultural e religiosa por parte dos espanhóis.
Nota-se, portanto, que repressão, o aculturamento e a guerra foram marcas presentes na América à época do desencontro de dois mundos diferentes.  O reconhecimento da diversidade não ocorreu. 

REFERÊNCIA:

FERREIRA, Jorge Luiz. Opressão, aculturação e guerra. In: Conquista e colonização da América Espanhola. p. 55-89. 

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