quinta-feira, 26 de junho de 2014

HALBWACHS: A MEMÓRIA COLETIVA


HALBWACHS, Maurice. Memória Coletiva e memória individual; memória coletiva e memória histórica. In:_____. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, Editora Revista dos Tribunais, 1990. p. 25-89.

Marcos dos Anjos Bezerra

            De família universitária desde seus vinte anos encarnou o filósofo, isto é, aquele para quem o cuidado no pensar é fundamental. Renegou a possibilidade de qualquer pensamento puramente individual. Assegurou que o fato social não é exterior ao cientista, não é exterior aos homens que o vivem. A Sociologia para ele é a descrição concreta da sociedade. Não podemos pensar nada, não podemos pensar em nós mesmos, senão pelos outros, através do coletivo.
Halbwachs, em Memória Coletiva, aponta que os testemunhos dos outros pode fortalecer ou debilitar as informações sobre um determinado fato. Geralmente a impressão de algo precisa dos testemunhos dos outros para reforçar a exatidão, pois as lembranças de uma pessoa estão alinhadas as lembranças dos outros. Exemplo dessa memória coletiva: o conhecimento adquirido não é puramente nosso, o temos através de leituras bibliografias.
À medida que convivemos com um grupo e nos identificamos com ele nossas memórias são as do grupo, chega-se a ideias através dos componentes dos grupos. Pode acontecer dos outros se lembrar de algo que eu não me lembre, pois não basta somente presenciar algo para que este se transforme em imagens significativas. É preciso que eu me identifique com o grupo de formação dessas imagens, caso contrário elas permanecerão nos escombros da memória.
As imagens que nos são impostas podem mudar a visão que eu tinha sobre um fato do passado. A partir dessa imposição pode-se obter uma maior exatidão sobre o fato, pois nos apoiamos em outras lembranças, assim como a nossa primeira impressão do acontecimento poderia ser a verdadeira e as lembranças dos outros introduzidos na nossa pode trazer a distorção do fato.
A convivência com um determinado grupo nos proporciona uma identificação com o mesmo e o meu passado se confunde com o do grupo a que pertenço, isto porque a convivência faz com que o depoimento dos outros sejam verdadeiros e tomamos como nosso. Em outras palavras as imagens dos integrantes do grupo se fundem com as nossas lembranças.
Pode acontecer que uma pessoa nos reconstrua algo e a nossa memória o capte como já visto, isto acontece devido o fato ter sido marcante tanto para mim como para a pessoa que está me relatando o acontecimento. A não interação entre as pessoas de um grupo provoca o esquecimento por uma das partes. Aquele que viveu a interação de um grupo terá maior lembrança.
A partir de Halbwachs podemos constatar que às vezes lembramo-nos de algo e às vezes não. Esquecer um período da vida é perder o contato com aqueles que nos rodearam e quando distanciamos de algo o que passa a predominar é uma lembrança vaga do acontecido. Lembramo-nos daquilo que experimentamos juntos aos outros. Um grupo com constantes entrada e saída de pessoas é propício do esquecimento da memória, isso acontece porque esse vai e vem de pessoas não forma a identidade do grupo.
            Um grande número de lembranças reaparece por interferência dos outros. Por mais que uma pessoa se diga sozinha, ela está apenas na aparência, isto porque o homem é por natureza um ser social e está confinando dentro de uma sociedade.
Halbwachs deixa claro que não existe a memória individual e a coloca como possível somente na consciência intuitiva, onde não entra os elementos do pensamento social. A nossa memória de criança é falha devido ao fato de nessa etapa da vida ainda não sermos um ser social. Nossas primeiras lembranças nos são passadas por nossos pais, ou seja, se forma coletiva. A lembrança que nos é passada pode representar o contato com o passado e termos uma reconstrução histórica.
Em uma viagem de adultos percebe-se uma variação das memórias. Uma pessoa que viaja, mas não interage com o grupo terá memórias diferentes das outras pessoas que interagiram. A vivência, o local e as relações entre as pessoas faz com que nossas lembranças permaneçam.
Cada grupo social empenha-se em persuadir seus membros. As nossas preferências e sentimentos são expressões colocadas em relação ao grupo a que pertencemos. As lembranças mais presentes são gravadas na memória dos mais próximos a nós e as difíceis de serem recuperadas dão-se devido a ela pertencer somente a mim e não a nós. Logo, a memória individual é um ponto de vista sobre a memória coletiva.
 A memória aparece por meio da vida pessoal. O indivíduo é membro de um grupo, evoca e mantém lembranças para o grupo. Por mais que se considere a memória individual ela não está fechada, pois ela é uma produção social. Muitas vezes me identifico como membro de um grupo sem ter participado ativamente e o conhecimento que tenho sobre ele se deu de forma indireta, como por exemplo, através de leituras de jornais ou depoimentos de pessoas que participaram ativamente. É uma memória emprestada e não minha. Caberia aqui uma classificação dessa memória: memória interna ou autobiográfica e memória externa ou histórica.
A memória histórica está atrelada ao conhecimento dos fatos históricos nos dados pelo meio externo. A memória interna é aquela a que estamos inseridos, e a histórica é o conhecimento dos fatos históricos depois de produzidos, nos relacionamos de forma afastada.
As pessoas de uma época assimilam seus hábitos e traços e aprendem a distinguir a fisionomia e aspecto de um período pelo meio contemporâneo. É em forma de lembrança que devemos dá significado aos fatos. Estes através de quadros coletivos não se resumem a datas, nomes e representam pensamentos onde se reencontra o passado. A história não abarca todo o passado. Ela engloba os grupos e as transferências de costumes modificados segundo os novos modelos. Essa constatação deixa claro que as marcas do passado podem ser percebidas e que os observadores contemporâneos analisam as mudanças.
A memória se apoia no vivido e conserva, apoia e reconstrói o passado mediante o presente. A morte de uma pessoa não interrompe a memória. A morte do Motorista Gregório devido à forma como ocorreu intensificou a memória ao seu entorno. As pessoas ao retratarem o Motorista Gregório o percebe com traços diferentes. Esse exemplo de história local difere da nacional, esta retém fatos que interessam aos membros da nação.
Há, portanto, uma diferença entre memória coletiva e memória histórica. A primeira se refere às lembranças que subsistem por si só, persiste na consciência do grupo, sendo inútil escrevê-la; enquanto que a segunda retrata aquilo que é escrito, se interessando pelas diferenças e contradições, se concentrando nas formações longas. Existem muitas memórias coletivas enquanto só há uma história. A memória coletiva ver as mudanças de dentro enquanto a história analisa as mudanças de fora.

Conclui-se que o autor é muito claro na defesa da memória coletiva sobre a possível existência da individual e que as diferenciações entre memória coletiva e história não se dá para sobrepor uma a outra, mas sim para justificar a importância de ambas, pois é impossível perceber a memória fora de um contexto histórico, bem como um contexto sem uma memória construída.

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