Marcos dos anjos Bezerra
A história dos Estados Unidos da
América da época colonial apresenta diversas dificuldades. Uma delas está no
fato de não existir Estados Unidos-Colônia. Existiam colônias autônomas dentro
da América do Norte. No entanto, muitos estudiosos acabam generalizando e
conferindo uma unidade disfarçada para a América anglo-saxônica. É preciso
rescindir aos programas tradicionais de explicação. Geralmente a versão tradicional
elabora certas “verdades didáticas” sobre a colonização inglesa. Estas
“verdades” separam as colônias em dois tipos: exploração e povoamento.
Segundo essa visão as colônias do
tipo exploração seriam as ibéricas, pois a meta central dos colonizadores era enriquecer
a metrópole, logo se explica o atual estado de subdesenvolvimento de países
como o Brasil, Peru, México, pois nesses países reinava a cobiça e desejo de
ascensão social. Já as de desenvolvimento seriam as anglo-saxônicas, onde o
objetivo dos aventureiros seria o povoamento da terra e por consequência o seu
enriquecimento, portanto, se tem a explicação do desenvolvimento atual, por
exemplo, dos Estados Unidos.
Só recentemente com visões novas e
mais fiéis aos documentos é que estas posições foram contrariadas. O escritor
brasileiro Vianna Moog critica tais versões. Para ele é preciso abordar outros
fatores para compreender o grau de desenvolvimento ou subdesenvolvimento de um
local, tal como os fatores geográficos e culturais, a religião. Nas áreas da
América do Norte o clima, o relevo, a hidrografia favorecia o trabalho do colonizador
se equiparado às áreas coloniais de Portugal ou Espanha. Dentro da questão
religiosa o ideal católico buscava a salvação da alma, o progresso era visto
com desconfiança, o trabalho deveria ser evitado pela elite, devendo ficar a
caráter dos seres inferiores. Já os protestantes pregavam o contrário:
valorizavam o trabalho e a riqueza era bem vista, logo a circulação de produtos
e pessoas eram mais intensos.
Não é o simples reducionismo aos
termos exploração e povoamento que propiciam respostas para as diferenças
existentes dentro da América. É preciso entender a colonização inglesa e suas
particularidades, para tanto é pertinente levar em conta a situação da
Inglaterra antes de iniciar esta colonização.
Ao final da Idade Média, a
Inglaterra havia enfrentado a Guerra dos Cem Anos, a Guerra das Duas rosas.
Estas guerras formou uma nacionalidade inglesa, uniu o país entorno de um objetivo
e colaborou para enfraquecer a nobreza e suscitar na Inglaterra o desejo de um
poder centralizado. A família Tudor foi a responsável pela afirmação do poder
real na Inglaterra, bem como pelo questionamento a autoridade papal. Henrique
VIII, Eduardo VI e Elizabeth ao enfrentarem a Igreja de Roma promoveu um
crescente nacionalismo. O primeiro rompeu com o poderio da Igreja Romana na
Inglaterra, fundou a religião Anglicana e tomou para si as terras e riquezas da
Igreja Católica. A última promoveu a época de expansão inglesa.
O século XVII na Inglaterra foi
marcado pela intensificação do processo dos cercamentos e juntamente com eles
houve o aumento do êxodo rural. As cidades aumentam e numero de pobres passa a
ser enorme. Pobres, mulheres, órfãos, religiosos perseguidos formaram a maior
parte do contingente de pessoas que emigraram para a América em busca de
melhores condições. Nessa época os choques entre rei e burguesia, entre
religião oficial e seitas colaborou para tornar o século XVII conturbado na
Inglaterra. Essa situação da Inglaterra ajuda a compreender a ausência de um
projeto colonial sistemático para a América. As pessoas que vieram para a
América tiveram que construir muita coisa, inclusive uma memória.
A primeira tentativa de colonização da América
do Norte se deu no reinado de Elizabeth. A soberana concedeu aos nobres terras
assegurando-lhes direitos. Tinha-se a preocupação em explorar o ouro e a prata.
Não se tinha de fato a preocupação de investir na colonização de terras
desconhecidas, a pirataria aos navios espanhóis repletos de ouro e prata era
mais vantajosa. Somente no século XVII é que a Inglaterra irá reviver o impulso
colonizador, mas tal empreita será entregue não mais a nobres individuais, mas
sim as Companhias.
Um dos setores mais difundidos
dentro da colônia americana foi à educação. Tinha-se o ideal da interpretação
individual da Bíblia, logo era necessário promover a difusão do conhecimento
para a população. Houve o esforço em prol da educação formal. A generalização
de escolas primárias e a preocupação de que todos aprendessem a ler e escrever estão
muito presentes nas colônias ingleses que nas ibéricas. A educação era feita
por membros da comunidade e paga pela comunidade. Surgiram várias universidades
e uma das consequências foi à baixa do analfabetismo.
Além da difusão do conhecimento
outra característica central das Treze Colônias foi à importância dada ao
trabalho. Enriquecer pelo trabalho é uma obrigação. O trabalho não seria um castigo,
mas uma benção. O dinheiro adquirido pelo trabalho era um sinal de ser eleito
por Deus.
Apesar da importância dada ao
trabalho pelos norte-americanos, a sua concretização não se deu de forma
homogênea. Dois modelos se desenvolveram: um centrado no trabalho livre, com a
economia pautada na mecanização interna; outro girava em torno do trabalho
escravo, no sistema de plantation e
voltado para o mercado externo.
Os principais prejudicados pelo
sistema colonial foram os índios e os escravos. Muitos autores falam de
genocídio para caracterizar as populações indígenas que sofreram na América do
Norte. Existe uma diferença entre o genocídio ibérico e anglo-saxão. Os
ingleses não integraram o índio no seu universo. Os ibéricos pretenderam apesar
de usarem a forma autoritária para tal objetivo. A escravidão foi intensa,
principalmente nas colônias do sul devido à necessidade de tal mão-de-obra para
a comercialização da monocultura. Tiveram locais que o número de escravos foi
tão intenso que se tornou um pesadelo para o mundo branco. Houve resistência, sejam
através de fugas, incêndios, insurreições, etc.
A população dos Estados Unidos
aumentou consideravelmente devido, sobretudo a imigração e ao próprio
desenvolvimento natural da população das colônias. Os principais imigrantes
foram os alemães, escoceses e irlandeses. Mas os franceses protestantes
marcaram sua presença. A elite comercial vivia nas cidades, mas a maioria
populacional das Treze Colônias era rural.
E a vida cotidiana dessas populações
muito se assemelhava ao modo europeu. A autoridade residia no pai e as mulheres
trabalhavam dentro e fora de casa. As mulheres casavam-se geralmente aos 24
anos. Apesar disso não tinham uma identidade legal. Depois dos sete anos as
crianças eram vestidas como pequenos adultos. Quase todos os homens andavam
armados. As igrejas anglo-saxônicas só tinham o que fosse necessário.
No século XVIII as guerras europeias
e seus reflexos na América irão alterar a história das Treze Colônias. A Guerra
dos Cem Anos, a Guerra do Rei Guilherme terminam mediante acordos entre os
envolvidos (Inglaterra e França), mas tais acordos representaram somente os
interesses ingleses, as necessidades dos colonos não foram levadas em conta. Os
questionamentos a respeito do domínio inglês começam a aparecer.
As tensões entre colonos e ingleses
aumentaram em razão da política conservadora implantada pela Inglaterra: a
presença militar na colônia custeada pelos colonos; a Lei do Açúcar visava
destruir a tradição dos colonos em comprar melaço mediante o comércio
triangular; Lei da Moeda proibia a emissão de crédito na colônia, buscava-se restringir
a autonomia das colônias; a Lei do Selo estabelecia que todos os documentos da
colônia deveriam ser taxados por selos da metrópole.
Devido a todas as leis restritivas
os norte-americanos se influenciam pelas ideias de John Locke. As ideias deste
formaram um bojo que levaria a proclamação da Independência das Treze Colônias.
Passaram a ser realizadas reuniões para discutir a situação no qual as Treze
Colônias estavam envolvidas e a solução encontrada foi redigir a Declaração de
Independência que ficou pronta em 4 de julho de 1776. Houve resistência por
parte da Inglaterra, no entanto, os norte-americanos obtiveram o apoio de
países rivais aos ingleses e em 1781 colonos e aliados obtém a vitória decisiva
na Virgínia. A tradição política aponta como alguns dos responsáveis pela
construção da recém-nação George Washington, Thomas Jefferson e Benjamim
Franklin.
Com a independência criou-se uma
constituição centrada na república federalista, pautada nos poderes executivo, legislativo
e judiciário. George Washington é eleito o primeiro presidente. A escravidão se
mantém e os norte-americanos se lançam no século XIX e XX na expansão de seus
territórios.
Conclui-se que a colonização
anglo-saxônica não contou com a tutela do Estado. Não houve na Inglaterra
moderna o monopólio católico onde o rei e Deus tinha a mesma fala. Calvinistas,
católicos e anglicanos fizeram os ingleses conviver com a diversidade. O
empreendimento da colonização foi feito por companhias comerciais. Houve a
estimulação a alfabetização nas Treze Colônias. As colônias prosperaram de
formas diferentes. O índio não foi assimilado, não houve projetos de catequização.
Com a aprovação de leis autoritárias houve reação e confrontos entre colonos e
ingleses aumentaram. A independência debilitou a Inglaterra, estimulou a
Revolução Francesa. Assim os Estados Unidos demonstraram ser possível romper o
Pacto Colonial e seu posterior desenvolvimento reforçou a ideia de que os EUA
era o modelo a ser seguido pelo restante da América.
REFERÊNCIA:
KARNAL, Leandro. Estados Unidos: da colônia à independência. São Paulo: Contexto, 1990.
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